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sexta-feira, 16 de março de 2012

Na margem


Lá estava ela, a loira sem cor, menina
Sentada, curvada, olhando para o mar,
Segurando uma descolorida pulseira fina
Que mal lembrava quando veio a ganhar.

Lembranças, esquecimentos, sonhos e planos,
Suspiros diários a assombrar o que tentou almejar
Tantos foram estes a formar buracos nos panos
Sonhos que antes, pesadelos vieram a se tornar.

Maquiadora, brinquedo, poeta, mergulhadora...
Aquela garota que já chegou a sonhar com tudo,
Hoje lamenta, encolhida, lutando contra seu luto.

Já não adianta olhar para frente, muito menos no agora.
Inadiável, inevitável, apenas espera o grande estopim,
Quando a velha pulseira se partir e tudo chegar ao seu fim.

Ao anoitecer

Que durma o cansado, o que brigou, o que viveu, o que precisa de uma pausa breve e aquele que precisa sonhar para que ao amanhecer, possa transformar seus sonhos em liberdade.

terça-feira, 13 de março de 2012

Desfalecida


Era uma flor, nascida no asfalto, sem muitas esperanças. Por muitas, eu, de meu apartamento que ficava no terceiro andar de um prédio, consideravelmente, antigo, via alguns garotos ignorantes que por pirraça pisavam e risos de deboche eram dados em direção à pobre flor que mal podia respirar naquela selva. O que a tornava encantador, talvez não fosse a sua beleza imensurável, ou a cor de suas pétalas que encantavam todos, que pudessem ser encantados por belezas deste mesmo tipo, mas sim a resistência que se mostrava ter.
Simples, pequena, sem muito o que dizer, afinal, o que poderia indagar sobre um vegetal comum? Sim, ela tinha um caule esverdeado e possuia pouco mais de sete pétalas. No dia seguinte, no dia seguinte, no dia seguinte, no dia seguinte. Certo, depois de um mês a observando, eu percebi o sofrimento, o que era sofrimento. Sim, depois disso, poucas as vezes que comentava alguma espécie de sofrimento de minha parte. Ao menos, quando pisaram em mim, constantes vezes, eu gritava, esperniava, jogava-me no chão desesperadamente a fim de que pudesse ganhar a atenção de um mosqueteiro que pudesse me acudir.
Lembra-se do garoto? Bom, o carrasco em questão era pontual. Não faltava de jeito maneira, todos os dias, duas vezes por dia, estava lá, passava pela rua de selva de concreto onde a plantinha guerreava. Sempre a mesma ação, sempre o mesmo ritual. Com suas mochilas batiam entre si, grupo de cinco, alguns gordos, outros magros, uns de aparelho, outros ruivos e com um olhar esquisito. O gordinho, ruivo, de aparelho, com sarnas, vestindo um jardineiro com uma camisa vermelha sangue era o que tinha o olhar diabólico. Parecia rir de tudo, mas não se encaixava em risadas de alegria, daquelas que se mostravam num tom puro, sem cordialidade, sem precisar de uma atenção e sim no sarcasmo, com tom de deboche.
E o ritual? Sempre o mesmo, sem mudança alguma, como se sentisse a necessidade de fazer aquilo. Sem mais, pulava com toda a força exigida para levantar o seu corpo juntamente com a bolsa que carregava nas costas. O pulo, sempre, direcionado à aguerrida. Um pulo, apenas. Logo depois o garoto saia saltitando, pelo continuo da calçada até o fim da rua.
Mas dessa vez algo fugia do comum. Logo após que a garotada virava na esquina seguinte, avistei uma menina, não mais que seis anos, vestindo um pijama rosa, sem detalhes adicionais. Lentamente, ia em direção à flor. Agacha-se e com toda a força que reuniu, segurando o pequeno caule, arrancou-a. E aí saiu correndo até a sua casa, logo alí, próximo à esquina contrária onde os garotos acabaram de estar. Dava para ver ao menos a varanda, então ainda a vi pegando um vaso cheio de terra e pondo a raíz ali.
Já não me preocupara mais, a mesma programação já não existia…
O observador em questão, alguns dias depois se levantara ouvindo o som de um jarro se quebrando. Ela estava seca, morta. A menina em prantos e por mais uma vez, lá estava o garoto rindo, debochando, agora, com as lágrimas da pequena.

O andar do morto

Para quem achou que isso morreu, calma. Hoje decreto o caminhar do morto blog aqui. [risos]